Segunda-feira, 17 de Setembro de 2007
Tem que ser. Esta já está sobrelotada. Ficam os posts em arquivo (Fevereiro 2005 a Junho 2005). Mudei de residência para
aqui e
aqui,
aqui e actualmente moro
aqui.
Nota: Antes, andei pelo
Bota Acima e pelo
Agua Lisa (1) onde restam textos em arquivo.
Saudações do João Tunes.
Quinta-feira, 2 de Junho de 2005
Um:Leio, esforçando-me por acabar com o riso (tem que ser - o Pedro olha-me aflito, o cão ladra como costuma ladrar furioso quando o Benfica marca golo, já vejo a cabeça de um vizinho empoleirada no estendal da roupa):
Exemplo prático sobre a verdadeira "educação testemunhal na evangelização da sexualidade":
Era uma vez um casal que tinha problemas de comunicação a nível sexual. A mulher já estava desesperada, e o marido ainda mais desesperado estava.
Um dia, o marido leu num jornal um anúncio que dizia "resolvo qualquer problema sexual com o método da evangelização" e, em desespero de causa, foi ver o que era.
Era um bonitão, que lhe explicou a simplicidade do método: marido e esposa cumpririam o dever conjugal, digamos assim que hoje vem a propósito, enquanto ele se sentava ao lado e ia lendo o evangelho em voz alta.
Em desespero de causa, assim fizeram. No dia aprazado, o casal foi ter com o bonitão, despiram-se, começaram, e o bonitão ia lendo em voz alta, sentado ao lado da cama. Às tantas a mulher começa a protestar, que é tudo igual, que não vê diferença nenhuma, que não vale a pena, e o marido lança um olhar aflito ao bonitão, que lhe diz: "vamos tentar de outra maneira - você vem para aqui ler, e eu vou para a cama com a sua mulher".
Trocaram, o marido começou a ler, o bonitão começou a fazer o trabalho do marido, e daí a nada a mulher já não estava nada com cara de querer reclamar.
Às tantas, o marido, furioso, grita:
"Vês, meu palerma, vês como se lê o evangelho?"
Claro, isto só podia vir da Helena que, entre outras muitas boas acções, também é o Alter Ego do Manuel António.
Dois:
Agarrem-me senão converto-me.
Quarta-feira, 1 de Junho de 2005
Recomendo a leitura do post do
Fumaças sobre a
eminência parda do
Castrismo, o irmão de Fidel -
Comandante Raul Castro.
A
Helena reagiu à minha
intromissão do post anterior (e que coloquei no Dedos de Conversa como comentário) e quase me acusou de mata-frades ao pensar-me assim:
estou cá a imaginar que se você fosse touro numa tourada, em vez de um pano vermelho bastava que lhe brandissem uma batina, e lá ia você, tu-tu-tum tu-tu-tum tu-tu-tum, e lá iam batina e toureiro!E rematou, tipo estocada inteira com direito a orelhas e rabo, com um terrível desafio:
Para tornar o debate muito mais fecundo, ganhando nós todos com a sua diferença, proponho um desafio: se você fosse padre, como falaria de sexualidade com os jovens? Hmmm, alto, já vi um primeiro problema. OK. Se você fosse pastor protestante, como falaria de sexualidade com os jovens?Sobre a ignorância da
Helena sobre touradas e o efeito do vermelho sobre os touros (sobre os curas, presumo que o contrário ocorra, exceptuando no colorido dos Conclaves), já a esclareci no seu sítio. Fi-lo, julgo, com a calma olímpica que possa ter um pacífico devorador de salsichas, embora me reste o mistério indecifrável do porquê de ela imaginar que se faça
tu-tu-tum (parece-me mais coisa de índios) quando um touro investe ou um herege tenta virar de pantanas um cura a fugir de sotaina arregaçada. O que demonstra a desgraça igual que é um ateu meter-se em coisas de religiões ou um crente caricaturar pessoas de nenhuma fé religiosa. E eu concedo que a asneira original foi minha. Mea Culpa. O que não me impede de continuar a perorar, sobretudo perante um repto estimulante.
Fica, que se esprema sem picardia nem sequer ironia, o desafio de eu me imaginar cura ou pastor a falar de sexualidade com os jovens. Que diria? Isso mesmo, que diria?
Boa pergunta, ficando claro, como declaração de princípio em ante-sala e para facilitar, que, em qualquer circunstância e sobre qualquer tema, se a desdita me tivesse levado a ser cura ou pastor, a primeira coisa que faria (ou devia fazer), sempre, era deixar de o ser. E esta nota aqui fica como mero sinal de respeito pela diferença e por achar que entendo bem que falamos do mesmo tema mas com posturas em plateias diversas, relativizando a essência provável da discordância.
Continuemos, imaginando-me cura ou pastor, nunca o sendo por não o poder ser. E isso remete-me ao meu papel de pai e de educador com vestes de laico procurando o bem. E só nessa qualidade respondo, dessacralizando a coisa. E digo-lhe:
- tenho por norma pedagógica não falar de sexualidade com os jovens. Escuto-os, tenho-lhe os ouvidos bem abertos (às palavras e aos sinais) e só entro em achegas se vir que há perigo à vista ou apetência em me saberem a opinião ou a experiência (o que só raríssimas vezes acontece). Porquê? Porque não acredito em educação sexual, em normativo sexual, em experiência sexual transmissível. E sou tolerante sobre os caminhos, que sei serem ínvios (só podem sê-lo) da descoberta da sexualidade, porque acredito que, sem os pisar ou evitar-lhes a atracção experimental e de descoberta, não há síntese de maturidade que resulte. A sexualidade não é esquecida mas não é um problema a necessitar de educação (excepto quanto à prevenção de doenças sexuais transmissíveis e à gravidez precoce ou não desejada), tanto mais que eu não tenho chave para ninguém (a minha cá vai andando mas sobre ela não falo por pudor e se ele me é permitido nesta conversa de amizade e bem querer) sobre os caminhos de autodeterminação sexual nem normas para dar ou vender, quanto mais testemunhar. E, para mais, nem sequer sei o que é o sexualmente correcto. Sou mais um intuitivo que um pedagogo, como vê. E assim me defendo não me demitindo. O tema vem quando vem (sempre e apenas quando lhes apetece, aos jovens) e procuro misturá-lo, enquadrando-o em outros valores, interesses e facetas, retirando-lhes uma carga autónoma de problema ou de tema. Sobretudo porque penso que a sexualidade é amor (mas tem um campo próprio e autónomo - de realização de prazer e o prazer só é ilegítimo quando agride alguém) mas que os seus caminhos são únicos e não transmissíveis, não julgáveis, livres de liberdade feita, em que qualquer testemunho normativo ou de mensagem (passado como evangelização ou como redenção dos pobres e oprimidos) é apenas um acto de violência e de tentativa de domínio sobre outro, com dolo se cometido sobre um jovem. Falando do mundo e das pessoas, de nós, de vós, deles, daqui, dali, não falamos de sexualidade? Oh se falamos. Não fosse assim, não se topavam à légua, como se topam, os sexualmente infelizes ou sexualmente sublimados (aqui está outra categoria dos infelizes sexuais). Por isso é que, querendo ou não, julgo que andamos permanentemente a dar educação sexual aos jovens. E como ele topam a nossa autoridade académica no assunto ou absoluta ou meia inépcia para tal arte. E aqui é que o touro torce o rabo, para terminar com um regresso de estilo aos tais curas, pastores e evangelizadores, ou seja, às minhas embirrações de estimação.
Leio:
Destacarei três frentes particularmente interpeladoras que apelam ao testemunho dos cristãos.
A nossa profecia cívica deve levar-nos a acabar com o sorriso cúmplice, diante dos «ladinos» que fogem ao dever de pagar impostos e ainda por cima se gabam da sua «esperteza». A ilegalidade, mesmo que menor, não pode ser vista como uma acção eticamente anódina, pois acaba por impor uma sociedade onde a única regra é a afirmação daqueles que não têm escrúpulos.
Também o mundo do trabalho profissional precisa de ser questionado. Se se deve denunciar com veemência a exploração dos trabalhadores, é também necessário defender que os direitos inerentes a uma actividade profissional não se podem divorciar dos correlativos deveres de honestidade e dedicação, particularmente no actual contexto em que os desafios da produtividade e da qualidade são decisivos para a saída da crise económica.
O mesmo se diga do campo da urgência da evangelização da sexualidade. A dimensão do fenómeno da pedofilia e doutras perversões deveria levar-nos a perguntar em que medida não seremos coniventes com o actual clima de erotização global que diariamente entra em nossas casas. As novas tecnologias da informação, designadamente a Internet, estão a ser utilizadas, com o nosso silêncio e porventura com a nossa conivência, para incitar a uma visão desresponsabilizada da sexualidade. Impõe-se cultivar um distanciamento crítico dessas armadilhas do hedonismo, através de uma educação testemunhal que ajude à formação de hábitos mais favoráveis a um desenvolvimento harmonioso da pessoa humana.
E julgo que percebi quase tudo. Mas fico à espera que o Manuel António Ribeiro nos explique, não precisando de cair nas armadilhas do hedonismo, como se faz a tal educação testemunhal na evangelização da sexualidade. Porque, com a Igreja que temos, a que anda por aí e diariamente entra em nossas casas, a inspiração parece escassear.
Terça-feira, 31 de Maio de 2005
Como uma parte significativa do eleitorado de Le Pen veio directamente do PCF, suponho que tenha havido reencontros de muita malta, nas comemorações da vitória do
Non e que não se encontrava há um porradão de tempo.
É-me um mistério da condição humana o mecanismo de nos defendermos não vendo aquilo que não queremos ver. Falo por mim que fiz militância de cegueira anos a fio (outras militâncias também e de olhos bem abertos, abone-se). E se falo de mistério a propósito de uma coisa tão óbvia e que tanto salta à vista no conhecimento do processo de cegueira construído, isso, mais que certo, não será mais que um mecanismo justificativo, agora em efeito de réplica, com alguma indecência na missão de nos justificarmos para não nos olharmos ao espelho com a sensação de que não passamos de um gajo fatela que andou por aí a enfiar barretes. E a menos que se seja saloio, campino ou folclórico dos fandangos, ninguém gosta de andar a passear um barrete enfiado na cabeça.
Pois temos aí obra parida (*) para ajudar os renitentes. Não só, mas também. Pelo menos, os menos renitentes dos mais renitentes. Afinal, obra aberta até aos cegos. Julgo até que ela só possa escapar aos zarolhos ideológicos os mais cegos entre os cegos da toleima porque vendo de um olho só, eles imaginam que vêm mais que todos e em nosso nome.
Batido em várias camadas do percurso do desencanto, o livro não deixou de me defrontar com várias perplexidades e só dessas hoje partilho espantos:
- Que força foi essa que levou uma mulher a que, por paixão, se casou com 16 anos com um revolucionário de 42 de idade, viveu um pouco de amor (mas suficiente para, desse amor, ter um filho) e depois tivesse suportado toda a vida no preço errado da sua escolha certa (dando como certa, como dou, a escolha de qualquer apaixonado ou apaixonada)?
- Que força foi essa a de Anna Larina que, tendo o marido destruído e assassinado às mãos dos seus, o filho subtraído e obrigado a mudar de apelido, suportasse as penas de prisão, tortura e campos de concentração (sim, no
Gulag, ó choramingas nos ombros dos tallibans vítimas de Guantanamo!), durante 16 anos e que, no final, acusou Estaline da parvoíce maior de permitir conservá-la no reino dos vivos, decidindo contar o que soube e sentiu, reabilitando-se a si e ao marido, recuperando para o filho o apelido de família.
- Que força foi essa para que esta mesma mulher, sofrendo e sobrevivendo por paixão, se recusasse a mitificar e a heroificar a vítima - seu marido e sua paixão - apesar de Lenine o ter apelidado de filho mais querido do nosso Partido, querendo-o humano (contraditório - corajoso na coragem, canalha na canalhice, revolucionário que não deixou de ser homem) para o sentir vivo e ao seu lado (seu homem, não seu herói)?
- Que talento foi esse, o de Anna Larina, para escrever com tamanho talento e força sobre uma das maiores perfídias entre as perfídias, através de um livro que é um hino de humanidade?
- Que monstruosidade foi (é) essa do Leninismo que permitiu que o mais incapaz mas mais cruel dos herdeiros de Lenine sentisse necessidade de destruir primeiro, liquidar depois, todos os companheiros de Lenine para que o Leninismo se realizasse?
- Que grande dignidade foi essa a do médico Ludgero Pinto Basto, homem de muitas lutas generosas, militante do PCP (e seu antigo dirigente ao nível do Secretariado), recentemente desaparecido (ler
aqui), ter feito da tradução da obra de Anna Larina Bukharina um dos seus grandes e últimos projectos de vida e de luta, morrendo comunista mas não cego entre cegos (eu vi, com os olhos já a curarem-se das cataratas ideológicas, a bílis a subir aos olhos de velhos bolcheviques da fracção cunhalista do PCP quando, em 1988, Bukharin foi reabilitado e ... readmitido como membro do PCUS, enquanto desbafavam "traidor do Gorbatchov que até limpou esse traidor e fascista do Bukharin, onde nós chegámos!")?
(*) Bukharine, Minha Paixão, Anna Larina Bukharina, Edições Terramar